Texto fabuloso, de António Quadros, este excerto que passo a transcrever. Pelo que sentiu, pensou e disse sobre Sintra, aqui vai a minha singela homenagem, por altura do 20º Aniversário da sua morte. Se o conhecimento não me falta, ainda está para ser feita a justa homenagem eterna ao homem que amou Sintra como um Mundo diferente.
"De Cíntia, como lhe chamavam os gregos e os túrdulos, deriva o nome de Sintra.
Cíntia era então, para sábios e poetas, o promontório da lua. O promontório da
lua! Fantástica, misteriosa designação... Que realidade escondida, que verdade
ignorada entreviram, lucidamente, os nossos longínquos antepassados? Nada ficou
escrito, e a tradição oral não conserva vestígios dos reines sonhados, dos
caminhos pressentido-os. Os séculos foram passando e, pouco a pouco, os homens
foram destruindo implacavelmente os velhos mitos. Não importa. Nós sentimos, nós
sabemos que só eles tinham razão, que Sintra não é um lugar como outro qualquer,
que Sintra caiu entre nós por qualquer morta aventura, que Sintra não nos
pertence, e nós não a merecemos porque não cremos na sua estranha origem.
Condições climatéricas, natureza do terreno, constituição geológico ? Mentira,
horrível mentira! A força que alimenta os fetos, erguendo-os até ao céu, e
dando-lhes natureza de Piore, a seiva que oferece às flores tão belos e variados
matizes, as mil tonalidades do verde, a harmonia duma paisagem em que os
rochedos e os penhascos se conjugam com as camélias e com os cisnes brancos, o
sangue que palpita nas veias da serra de Sintra, vêm da lua, da nuvem, de toda a
parte, menos deste mundo.
Os que amam Sintra, os adeptos da sua doce religião
pagã, sabem-no bem. É um mundo diferente, onde a beleza é o ar que se respira, e
a poesia é a própria respiração. Este ponto fresco do vale, em que o olhar sobe,
trepando a vegetação da montanha, atravessando as paredes frias do Palácio da
Pena e perdendo-se ao longe, para lá do dia e da noite; aquele panorama do
Castelo dos Moiros em que, sentados nas ameias gastas da muralha, avistamos o
mar confundido com o céu; aquele outro lugar onde o Paço Real de Sintra, pesado
de história, se esconde por detrás dum muro inteiramente coberto de musgo velho
ou o momento irreal em que a vista da serrania, com o céu, a floresta, e a
rocha, o cheiro húmido da erva medrando em todo o lado, o fino som da água
caindo da fonte e das aves cantando nas copas das árvores, se transformam numa
única sensação, nova, selvagem e indiferenciada, nada disso pode fazer parte da
nossa humanidade." In AntónioQuadros.blogspot.
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